quarta-feira, 31 de março de 2010
A Pedra do Reino
Autoria: Luiz Fernando Carvalho, Luís Alberto de Abreu e Braulio Tavares
Direção geral e de núcleo: Luiz Fernando Carvalho
Período de exibição: 12/06/2007 – 16/06/2007
Horário: 22h
Nº de capítulos: 5
Elenco:
Irandhir Santos - Dom Pedro Diniz Quaderna
Abdias Campos - João Melchíades Ferreira
Allyne Pereira - Dina me Dói
Américo Oliveira - Argemiro
Anthero Montenegro - Gustavo de Moraes
Beatriz Lélis - Mãe
Claudete de Andrade - Joana Quaderna Garcia-Barreto
Elias Mendonça - Dom Ezequiel Veras
Everaldo Pontes - Pedro Beato
Flávio Rocha - Lino Pedra Verde
Frank dos Santos - Leônidas
Germano Haiut - Edmundo Swendson
Hilda Torres - Genoveva Moraes
Iziane Mascarenhas - Clara Swendson/Isabel
João Ferreira - Velho Nazário
Jones Melo - Antônio de Moraes
José Yago TR vilar - Dom Pedro Sebastião Garcia-Barreto
Júlio César da Rocha - Dr. Pedro Gouveia
Jyokonda Rocha - Onça Caetana/Maria Inominata
Lázaro Machado - Ludugero Cobra-Preta
Luiz Carneiro - Bastião
Maneol Constantino - Dom Manoel Viana
Márcio Tadeu - Frei Simão
Mayana Neiva - Heliana/Moça Caetana
Mestre Salustiano - Pedro Cego
Millene Ramalho - Margarida
Moisés Gonçalves - Pedro Justino Quaderna
Nelson Lima - Severino Brejeiro
Nill de Pádua - Malaquias/Dom João Ferreira Quaderna, o Execrável
Paulo César Ferreira - Sinésio
Pedro Henrique Dias - Garcia-Barreto
Pedro Salustiano - Rei Azul
Prazeres Barbosa - Comendador Basílio Monteiro/Dom Eusébio Monturo
Sandra Belê - Maria do Badalo
Servílio de Holanda - Silvestre
Soia Lira - Dona Carmem Torres Martins
Tavinho Teixeira - Luís do Triângulo
Tay Lopez - Adalberto Coura
Vanderléia Pimenta - Maria Sulpícia
Zé Borba - Mateus
Frank Menezes - Samuel Wandernes
Jackson Costa - Clemente Ravasco
Jessier Quirino - Euclydes Villar
Luiz Carlos Vasconcelos - Arésio
Renata Rosa - Maria Safira
Marcélia Cartaxo - Tia Filipa Quaderna
Felipe Rodrigues - Quaderna (criança)
Jéssica Araújo - Rosa
Vanderson Taveira - Arésio (criança)
Cacá Carvalho - Juiz Corregedor
A Trama:
- A pedra do reino é uma minissérie adaptada do livro O romance d´a pedra do reino e o príncipe do sangue do vai-e-volta, considerado a obra-prima do escritor paraibano Ariano Suassuna. Co-produção da TV Globo com a produtora independente Academia de Filmes, foi exibida de 12 a 16 de junho de 2007, em comemoração aos 80 anos do escritor, que fez aniversário no dia da exibição do último capítulo.
- A minissérie, filmada em 16 mm e finalizada em alta definição, foi adaptada por Braulio Tavares, Luís Alberto de Abreu e Luiz Fernando Carvalho – que também assinou a direção da trama. Foi a primeira realização do projeto Quadrante, idealizado para mostrar a diversidade cultural do país através da adaptação de obras literárias nacionais filmadas na região onde se passa a história original, com a participação de elenco e mão-de-obra locais. O projeto visa descentralizar o processo artístico e de produção, além de ajudar na formação de novos profissionais, criando um viés educacional. A pedra do reino teve como cenário a cidade de Taperoá, no sertão da Paraíba.
- Escrito em 1971, o livro é um misto de romance de cavalaria e novela picaresca, mostrando que as culturas nordestina e sertaneja têm raízes ibéricas, com muitos elementos da Idade Média, da commedia dell´arte e também da cultura árabe, por conta de mais de 700 anos de dominação de Portugal e Espanha pelos mouros. Lendas, sebastianismo, fatos verídicos, muita sátira e o universo das cavalhadas, dos romancistas, cordelistas, cantadores e repentistas do sertão estão presentes na adaptação feita para a TV, que ganhou desfechos inexistentes no livro, criados pelo próprio Ariano Suassuna especialmente para a minissérie.
- A epopéia sertaneja criada por Suassuna narra as aventuras, delírios e desventuras do cronista-fidalgo, rapsodo-acadêmico e poeta-escrivão D. Pedro Dinis Ferreira Quaderna (Irandhir Santos), um sertanejo contador de histórias, que recorre a seus antepassados e a suas memórias para lidar com as inquietações existenciais. Quaderna sonha ser o Grande Gênio da Raça, o autor de um “romance heróico-brasileiro, ibero-aventuresco, criminológico-dialético e tapuio-enigmático de galhofa e safadeza, de amor legendário e de cavalaria épico-sertaneja” ou, ainda, de “uma espécie de Sertaneida, Nordestíada ou Brasiléia”. Em suma, o escritor de uma grande obra literária que expresse a verdadeira identidade nacional. Em seu “estilo régio” de enxergar e contar o mundo, ele usa a imaginação para dar novo colorido à realidade. Tanto no livro quanto na adaptação para a TV, Quaderna atua como o narrador da história.
- Ficção e fatos reais se misturam na narrativa desenvolvida por Ariano Suassuna. Quaderna é bisneto de João Ferreira Quaderna, o Execrável (Nill de Pádua), real líder sebastianista que se proclamou legítimo rei do Brasil e causou a morte de muitos fiéis em nome da ressurreição de Dom Sebastião, o rei português desaparecido em 1578, aos 24 anos, na famosa batalha entre mouros e cristãos em Alcácer-Quibir, no Marrocos. O derramamento de sangue orquestrado por João Ferreira se deu em 1838, aos pés de duas rochas compridas e paralelas, conhecidas como Pedra Bonita - nome primitivo da Pedra do Reino -, na região de São José do Belmonte, em Pernambuco. Sua seita, formada por fanáticos religiosos, defendia que aquelas eram as torres da catedral do reino de Dom Sebastião, que seriam desencantadas com o sangue de sacrifícios humanos. Após muitas mortes, os fanáticos foram presos ou mortos pela polícia.
- Quaderna junta a história de seu bisavô a outro acontecimento trágico - a morte misteriosa de seu tio-padrinho, o rico fazendeiro D. Pedro Sebastião Garcia-Barreto (Pedro Henrique), quem ele considerava um pai. Ele é afilhado e sobrinho de Dom Pedro Sebastião por parte de mãe, Maria Sulpícia (Vanderléia Pimenta). Em suas pesquisas, conclui que suas duas famílias remontam ao mesmo rei: Dom Sebastião, de Portugal. Influenciado pelas histórias de realeza e pela cultura sertaneja em que foi criado, convivendo com cantadores, poetas populares, folguedos e cavalhadas do sertão, Quaderna passa a sonhar com um novo reino. Ele vai à Pedra do Reino e se coroa Rei, herdeiro legítimo do trono do sertão e do Brasil, e dá início ao projeto de sua grande obra.
- Quaderna pretende juntar referências eruditas, políticas e intelectuais em seu projeto literário. Para tanto, mescla conhecimentos sobre genealogia, astrologia e cultura popular, herdados de seu pai, Pedro Justino (Moisés Gonçalves), e do violeiro e poeta João Melchíades (Abdias Campos), com as idéias políticas e literárias de seus dois mentores, o revolucionário comunista Clemente Ravasco (Jackyson Costa) e o monarquista conservador Samuel Wandernes (Frank Menezes).
- Samuel é um promotor de justiça, fidalgo dos engenhos do Recife, apaixonado pela aristocracia e pelos brasões armoriais. Ele sustenta que a família Garcia-Barreto tem origem no próprio rei Dom Sebastião de Portugal, que, após escapar da morte na batalha contra os mouros, teria vindo incógnito para o Brasil. Direitista, Samuel declara fidelidade a Plínio Salgado, o fundador do movimento ultranacionalista Ação Integralista Brasileira.
- Já Clemente é um advogado e historiador negro-tapuia, que foi professor de Quaderna na infância e, como esquerdista e partidário do líder comunista Luís Carlos Prestes, sonha com revoluções como as de Zumbi dos Palmares e a que o líder religioso Antônio Conselheiro empreendeu em Canudos, no interior da Bahia. Companheiros e eternos adversários, ele e Samuel se desentendem constantemente, mas não conseguem ficar afastados um do outro.
- Quaderna funda com seus dois mentores a Academia dos Emparedados do Sertão da Paraíba, integrada apenas pelos três. Influenciado pelas diferentes vertentes políticas e culturais, passa a se intitular “monarquista de esquerda”. E em sua busca pela real identidade do Brasil, defende que a verdadeira base do povo brasileiro está na miscigenação dos povos europeu, africano e indígena.
- Na minissérie, a história tem início com a chegada de uma trupe circense, liderada por um velho palhaço, a um povoado. Em sua carroça-palco, ele abre um grosso livro e dá início à representação de um romance memorialístico: A pedra do reino. O palhaço é Pedro Dinis Quaderna, o protagonista do romance, já envelhecido, e as histórias são suas próprias lembranças. A partir daí, a narrativa se desdobra em três tempos e espaços diferentes, que se comunicam entre si: o momento em que o velho palhaço comanda um espetáculo popular de rua; as imagens em que ele, mais jovem, está preso e escreve sua história; e as cenas do inquérito, promovido pelo Juiz Corregedor da capital (Cacá Carvalho), que o levam à prisão.
- Longe de ser um problema, o interrogatório acaba sendo a solução para que Quaderna escreva sua obra. Por causa do “cotoco”, uma proeminência óssea no final de sua coluna, ele não pode ficar sentado por muito tempo, dedicado à redação de sua epopéia. Uma vez no inquérito, poderia contar, em pé, todos os acontecimentos relacionados a sua vida, aproveitando o depoimento datilografado pela escrivã Margarida (Millene Ramalho), moça pura e recatada da alta sociedade taperoaense, para escrever sua saga.
- Quaderna sente atração por Margarida, mas é repelido por ela, que, no entanto, sucumbe às investidas do depoente após ser provocada por relatos maliciosos de episódios, que a deixam constrangida e excitada. A máquina de escrever acaba unindo os dois personagens, pois é ela que registra as memórias que Quaderna sonha em transformar em livro. Com o depoimento escrito, ele pode, enfim, fazer a obra do Gênio da Raça e concluí-la antes de seus dois concorrentes, Clemente e Samuel, que também desejam o título.
- A razão da prisão de Quaderna, que acontece no ano de 1938, é a invasão da cidade de Taperoá, três anos antes, por uma estranha cavalgada de ciganos que conduz um jovem e enigmático rapaz montado num cavalo branco: Sinésio, o Alumioso (Paulo César Ferreira), filho de D. Pedro Sebastião, dado como morto. A cavalgada é comandada pela misteriosa figura do Doutor Pedro Gouveia (Júlio César) e acompanhada por Frei Simão (Márcio Tadeu), misto de frade e cangaceiro, e por Luís do Triângulo (Tavinho Teixeira), guerreiro da guerra civil de Princesa, ocorrida em 1930. Mas o grupo é emboscado às portas da cidade, pelo bando de cangaceiros de Ludugero Cobra-Preta (Lázaro Machado), e todos acreditam que a armadilha foi armada a mando de Arésio (Luiz Carlos Vasconcelos), meio-irmão de Sinésio, com quem ele não queria dividir a herança deixada pelo pai. Quaderna é intimado por causa de uma carta anônima endereçada ao Juiz Corregedor da capital que o acusa de envolvimento nos acontecimentos, tidos como uma rebelião popular. Afinal, vivia-se um clima político carregado, com a Revolução de 1930, a Revolução Comunista de 1935 e o golpe do Estado Novo, em 1937.
- A trama também mostra acontecimentos de 1930, quando Dom Pedro Sebastião Garcia-Barreto - pai de Arésio, do primeiro casamento; de Silvestre (Servílio de Holanda), filho bastardo; e de Sinésio, do segundo casamento - dá a Quaderna a missão de conduzir o filho caçula à capital da Paraíba, onde ficaria em segurança na casa do sócio Edmundo Swendson (Germano Haiut). D. Pedro Sebastião participara da Revolução de 30, deflagrada contra o presidente do Estado da Paraíba, João Pessoa, e considera prudente afastar o filho da cidade. É na casa do sócio de seu pai que Sinésio conhece Heliana Swendson (Mayana Neiva), por quem se apaixona. No mesmo ano, porém, D. Pedro Sebastião é apunhalado e morto de forma misteriosa, num pequeno quarto sem janelas, na torre de sua fazenda, com a porta trancada por dentro, enquanto Sinésio desaparece sem deixar rastro, e Silvestre perde-se pelos caminhos do sertão, vivendo como guia do rabequeiro Pedro Cego (Mestre Salustiano) e empreendendo uma busca incessante por Sinésio. Em seus últimos anos de vida, D. Pedro Sebastião estava se tornando cada vez mais místico e misterioso: encomendava escavações e dizia ter encontrado um tesouro escondido. Chegou a preparar um mapa do tesouro, prometendo a Quaderna que lhe revelaria sua localização, mas morre antes disso.
- Conhecido como “o prinspo do povo e do sangue do vai-e-volta”, Sinésio ressurge cinco anos depois, em 1935, na tal estranha cavalgada, no momento em que Arésio receberia toda a herança do pai, depois dos anos de interdição, em função do desaparecimento tanto do testamento quanto do filho caçula. A cidade se divide entre os mais abastados, que tomam o partido de Arésio, e o povo, que adere a Sinésio. Ao ver o “príncipe” ressuscitado, a população acredita que ele é a encarnação do rei Dom Sebastião de Portugal, que, finalmente, voltou para instaurar seu reino mítico, representando a redenção de todo o povo pobre sertanejo. Instaura-se o conflito, com emboscadas e tiros entre os partidários dos dois filhos de Dom Pedro.
- No longo depoimento prestado ao Juiz Corregedor, Quaderna desfia os acontecimentos relacionados a sua história, entre eles o sangrento movimento messiânico de seus antepassados na Pedra do Reino; a infância na fazenda de seu padrinho; a formação religiosa no Seminário da Paraíba, de onde foi expulso quando expôs suas idéias sobre o inusitado catolicismo-sertanejo, religião regada a mulheres e vinho; e os encontros amorosos com Maria Safira (Renata Rosa), a esposa de Pedro Beato (Everaldo Pontes) - velho sábio e penitente que nunca lhe tocou o corpo. Foi Safira, mulher tida como possessa, quem salvou Quaderna dos efeitos do “chá de cardina” que seu pai lhe dava na adolescência para “abrir” a inteligência, mas que prejudicava a virilidade.
- Quaderna também relata suas estranhas visões com personagens míticos como a Moça Caetana (Mayana Neiva), mulher bela e terrível, com dorso felino de onça e pescoço envolto em uma cobra coral que lhe serve de colar. É uma mensageira da Morte, assim como a Onça Caetana (Jyokonda Rocha), mistura de bicho-fêmea e mulher, que exerce um fascínio próprio de sua divindade. Além disso, Quaderna também discorre sobre o misterioso mapa do tesouro, a morte do padrinho, o desaparecimento de seu filho predileto e a associação entre o primogênito Arésio e o maior inimigo de seu pai em vida, o usineiro Antonio de Moraes (Jones Melo).
- Muitos outros personagens aparecem nos relatos do depoente. Como o idealista e visionário Adalberto Coura (Tay Lopez), jovem revolucionário que tenta convencer Arésio a usar sua ferocidade e personalidade dominadora a favor da Revolução Socialista. Mas, embora despreze as autoridades, Arésio é um individualista, contrário às teorias revolucionárias. No meio dos dois está a jovem Maria Inominata (Jyokonda Rocha), noiva de Adalberto e antiga paixão de Arésio, que ele viola para desafiar o amigo a continuar querendo a moça “por amor aos oprimidos”.
- Na narração de Quaderna também aparecem Clara Swendson (Iziane Mascarenhas) e Gustavo de Moraes (Anthero Montenegro), filhos de Edmundo Swendson e Antônio de Moraes, adversários nas atividades econômicas e políticas. Os dois jovens são a favor de um “embranquecimento” da raça humana e fazem um pacto de amor casto, em uma alusão ao nazi-fascismo.
- Outro personagem destacado por Quaderna é o violeiro Lino Pedra-Verde (Flávio Rocha), seu amigo de infância, acostumado a ter visagens desde menino. Suas premonições se agravaram depois que passou a mascar erva-moura e beber o vinho encantado da Pedra do Reino, cuja receita foi descoberta por Quaderna.
- Ao final do inquérito, o Juiz, exasperado com o intimado - que mistura informações reais e concretas, formulações eruditas e lendas, relatos, crenças e superstições populares -, considera-o louco e o liberta. Mas Quaderna pede-lhe que seja preso, confessando que foi ele próprio quem escreveu a denúncia anônima para se utilizar do depoimento datilografado e escrever sua saga.
- O Juiz satisfaz o desejo de Quaderna e o coloca na prisão. Lá, ele escreve sua história. E, já bem envelhecido, como que inserido em um sonho, é sagrado rei da Távola Redonda da Literatura do Brasil, por poetas, escritores e acadêmicos do Brasil e do mundo, entre eles Shakespeare (Frank dos Santos), Cervantes (Maurício Castro), Arthur Azevedo (João Irênio) e Olavo Bilac (Tavinho Teixeira).
Produção:
- As filmagens de A pedra do reino em Taperoá, incluindo o período de preparação do elenco, foram realizadas durante os três últimos meses de 2006. Habitantes da cidade e de regiões próximas passaram por um processo de seleção para trabalhar nas mais diversas atividades, atendendo à proposta da minissérie de formação de profissionais locais. Quatro integrantes do elenco são taperoaenses de nascimento, a menina que viveu a pequena Rosa é moradora de Taperoá e os intérpretes de Quaderna e Arésio crianças moram, respectivamente, nas cidades vizinhas de Juazeirinho e Assunção.
- Taperoá conviveu com mais de 250 “forasteiros”, entre profissionais das diversas áreas e os cerca de 60 atores escalados para a minissérie. O elenco de A pedra do reino é formado essencialmente por atores nordestinos, em grande parte escolhidos após pesquisas e testes nos principais centros culturais do Nordeste. Todos com as mais diversas origens artísticas, desde integrantes de grupos de teatro de rua a profissionais com passagens pelo cinema e larga experiência teatral, que nunca haviam feito TV e, por isso, desconhecidos do grande público. A começar pelo intérprete do narrador Quaderna, o ator Irandhir Santos. Pernambucano, ganhou o prêmio de melhor ator coadjuvante no 39º Festival de Brasília, por sua atuação no filme Baixio das bestas (2007), de Cláudio Assis. Ele fez sua estréia na TV nesta minissérie.
- Uma cidade cenográfica foi construída no trecho final da principal rua de Taperoá, conhecido como Chã da Bala. O cenário foi concebido como uma cidade-lápide, com detalhes que lembravam um cemitério. A idéia era criar um espaço de louvor à memória dos antepassados. As casas existentes no local ganharam revestimentos nas fachadas, o chão recebeu 40 cm de terra e a área, de 2 mil metros quadrados, ganhou 35 nichos e foi fechada de forma a transformá-la em uma arena octogonal. Um portal, com um espaço interno cenografado como uma igreja, foi construído para, dentro do contexto da história, servir de ligação entre o mundo externo e o universo mágico da arena. Também foi erguida uma edificação representando os Arcos de Roma. Uma das casas da arena foi usada como base para os camarins de figurino e caracterização. A área de cenografia, chefiada pelo cenógrafo João Irênio, aproveitou cerca de 80 pessoas da região para levantar e adereçar a cidade cenográfica em pouco mais de 25 dias. A carroça de Quaderna, posicionada no centro da arena, também mereceu atenção especial. Ela foi inspirada nas carroças ciganas e tinha dois palcos giratórios, cujo movimento circular representava o ponteiro de um relógio: uma forma de trabalhar o tempo cíclico.
- Também foram usados como locações uma cadeia desativada (cenário do inquérito a que Quaderna é submetido); a Serra do Pico - o ponto mais alto de Taperoá; e uma área na cidade vizinha de Cabaceiras. O cenário da cadeia tinha uma estrutura semelhante a um octógono tridimensional, intercalando paredes móveis que se deitavam no chão com duas arquibancadas, onde se sentavam todos os personagens, fazendo as vezes de platéia. O espaço, todo em madeira, multiplicava-se em diversas formas, a partir da improvisação dos atores e da câmera.
- O supervisor de caracterização Vavá Torres também recrutou pessoal para dar apoio na maquiagem. Assim que chegou em Taperoá, foi em busca de cabeleireiros e maquiadores e formou um grupo de cinco meninas para confeccionar perucas. Em troca de sobras de cabelos para montar perucas, barbas e bigodes, ofereceu cortes gratuitos de cabelo na cidade. Não faltaram voluntários.
- Para ter maior controle da luz e alcançar a fotografia desejada, as filmagens contaram com um butterfly de 2600m2, dividido em três módulos de 800m2 cada, sustentado por 16 colunas de 14m de altura. O butterfly foi montado pelos funcionários da empresa Cinecidade, de José Macedo de Medeiros, o Jamelão, com o apoio de mais seis trabalhadores locais.
- Obras de artistas plásticos como Giotto, El Greco, Goya e Velásquez, além de referências barrocas, medievais e sertanejas, serviram de inspiração para a estética adotada na minissérie.
- Couro, metal, chapas de fotolito, lata, tapeçarias, restos de ossos, palha, madeira, palitos de picolé, enfim, os mais diversos materiais foram utilizados tanto na confecção dos figurinos supervisionados por Luciana Buarque quanto na criação dos objetos alegóricos elaborados no ateliê de arte. A oficina de arte, supervisionada pelo artista plástico Raimundo Rodriguez, envolveu 24 artesãos na criação de objetos e animais cenográficos, entre coroas, espadas, marionetes, bichos selvagens e mais de 40 cavalos em tamanho natural, feitos com sobras de materiais como palha de milho e de carnaúba, estopa, resto de isopor, ossos, latas, serragem e papel, todos equipados com um mecanismo que permitia a sua movimentação em cena. A equipe de artesãos contou com profissionais reconhecidos, como o pernambucano José Lopes da Silva Filho, conhecido como Mestre Zé Lopes, um dos mais conceituados criadores de mamulengos do Brasil, responsável pela produção dos bichos articulados utilizados em diferentes seqüências da minissérie.
- As equipes de figurino, arte, cenografia e caracterização foram encabeçadas pelos mesmos profissionais que trabalharam com Luiz Fernando Carvalho na minissérie Hoje é dia de Maria (2005).
- O trabalho de preparação do elenco da minissérie A pedra do reino envolveu três meses de intensa dedicação, entre aulas de expressão corporal e voz, interpretação, leitura do texto, palestras e mergulho na obra do escritor. A atriz Fernanda Montenegro, embora não estivesse no elenco, foi convidada pelo diretor para abrir os ensaios com uma palestra para os atores. O psicanalista junguiano Carlos Byington e o próprio escritor Ariano Suassuna também falaram ao elenco: o primeiro analisou os arquétipos dos personagens, e o autor discorreu sobre a obra e suas motivações ao escrevê-la.
- Diariamente, o elenco ensaiava com o diretor Luiz Fernando Carvalho e sua equipe de colaboradores, entre eles: Tiche Vianna, diretora e pesquisadora da linguagem teatral no Barracão Teatro em Campinas, que trabalhou a preparação do corpo através de máscaras de expressão; o ator Ricardo Blat, que atuou nas duas jornadas de Hoje é dia de Maria e trabalhou como preparador do elenco na área de interpretação; a professora de dança Lúcia Cordeiro, responsável pelo trabalho de consciência corporal e respiração; e a bailarina Mônica Nassif, que deu aulas de dança para o grupo.
- Os atores também tiveram uma iniciação à estética e aos passos de dança do Cavalo Marinho, teatro popular de rua nascido na zona da mata pernambucana, utilizado pela direção na transposição do romance para a TV. Instrumentos, personagens e reconhecidos músicos do folguedo, como os tocadores de rabeca Mestre Salustiano e Luiz Paixão, atuaram na minissérie. Além da rabeca, instrumentos como bage, pandeiro, ganzá e apito fazem parte da brincadeira, que é composta por música, dança, poesia, coreografias, loas, toadas e reúne cerca de 76 personagens divididos em três categorias: animais, humanos e fantásticos. Os personagens, com suas máscaras próprias, improvisam a partir do tema das toadas tocadas pelo banco de instrumentistas e cantadores. Mateus e Bastião são os dois palhaços responsáveis por levarem todos os personagens para dentro da roda. É a commedia dell’arte brasileira. Inserir o cavalo marinho na adaptação da obra de Suassuna foi mais uma forma de enriquecer a encenação com elementos da cultura popular, linha que norteou todo o trabalho. As roupas usadas pelo Quaderna velho, o palhaço medieval, por exemplo, foram inspiradas na imagem do personagem Cucurucu, da commedia dell’arte, e nos palhaços Mateus e Bastião, mostrando como a cultura brasileira foi impregnada pela cultura medieval e ibérica.
- Outra manifestação de rua presente no enredo é a Cavalhada, folguedo popular do Nordeste inspirado nas lutas dos cristãos contra os mouros, que contrapõe 12 participantes vestidos de azul a outros 12 vestidos de vermelho, respectivamente liderados pelo Rei Azul (interpretado na série pelo dançarino pernambucano Pedro Salustiano, filho do famoso músico Mestre Salustiano) e pelo Rei Encarnado (Henrique Albuquerque). Os integrantes vestiam burrinhas feitas em papelão e metal, penduradas em suspensórios, inspiradas no personagem Capitão, do Cavalo Marinho. Os passos do Cavalo Marinho, ensinados ao elenco por Pedro Salustiano, serviram de base para a coreografia da Cavalhada encenada na minissérie.
- A popular Folia de Reis serviu de inspiração para a criação do coro da Maria do Badalo, formado pelas cantoras Sandra Belê e Renata Rosa, e por Zefinha e Maíca - duas cantadeiras da região de Aliança (PE). O grupo formou uma espécie de coro de tragédia grega, que acompanha a fábula e age como a consciência crítica do povo. Sandra Belê é de Zabelê, uma cidade incrustada no sertão paraibano, que tem apenas dois mil habitantes. Renata Rosa nasceu em São Paulo, mas se apaixonou pelo canto e folguedos populares da zona da mata pernambucana e do baixo São Francisco alagoano e passou a se dedicar a eles, inclusive tocando rabeca. O coro era acompanhado pela rabeca do músico Luiz Paixão.
- As duas formações rochosas pontiagudas conhecidas como Pedra do Reino foram pintadas em um enorme painel, de 14m de altura e 8m de largura, pelo artista plástico Dantas Suassuna, filho de Ariano Suassuna. O painel foi usado como cenário para as cenas do massacre sebastianista promovido pelo bisavô de Quaderna.
- A minissérie conta com alguns efeitos especiais, como imagens inseridas por computação gráfica, realizados pelas equipes da Lobo e da Vetor Zero, empresas de São Paulo.
Curiosidades:
- Atores estreantes na minissérie foram convidados a trabalhar em outras produções da TV Globo. Mayana Neiva, intérprete de Heliana Swendson e da Onça Caetana, foi escalada para viver a personagem Karina na minissérie Queridos amigos (2007), de Maria Adelaide Amaral. Prazeres Barbosa, que interpretou três papéis em A pedra do reino, viveu uma doméstica na novela Duas caras (2007), de Aguinaldo Silva.
- Jackyson Costa, que estava há anos afastado da TV, desde sua estréia como o padre Lívio na novela Renascer (1993), de Benedito Ruy Barbosa, ganhou o papel do personagem Waterloo, em Duas caras. Marcélia Cartaxo também voltou ao ar, como a personagem Tonha, da novela Desejo proibido (2007), de Walther Negrão.
- Millene Ramalho, intérprete de Margarida, ficou quase duas horas em um molde de gesso para que a equipe de arte, com o auxílio do supervisor de caracterização Vavá Torres, desenvolvesse um corpete que pudesse adaptar a máquina de escrever a seu corpo. No total, o figurino da atriz pesava sete quilos e meio.
- Assim como na ficção, o ator Abdias Campos, cordelista e violeiro na vida real, foi quem ensinou o colega de elenco Flávio Rocha (Lino Pedra Verde) a tocar viola.
- A figura imponente de João Ferreira, o Execrável (Nill de Pádua), foi inspirada nos ícones russos e em personagens da ópera de Pequim (China). O personagem tinha três metros de altura, barbas longas e vestia um manto de mangas largas e uma coroa de metal cravejada de pedras vermelhas que lhe davam ainda mais grandiosidade.
- O diretor homenageou o filme As mil e uma noites (1974), do cineasta italiano Pier Paolo Pasolini, na primeira vez que o Juiz Corregedor aparece na trama: um enorme pálio nas cores azul e vermelha, com detalhes em dourado, foi especialmente feito para a seqüência.
- A Editora Globo lançou dois volumes sobre a realização da minissérie. O primeiro contendo os fac-símiles dos roteiros de filmagem de Luiz Fernando Carvalho, com anotações, desenhos e comentários rabiscados pelo diretor durante as gravações, e um livreto com trechos dos diários do diretor, do elenco e da equipe criados espontaneamente durante os períodos de ensaios e filmagens. O segundo volume é um livro de fotos com o registro do trabalho de preparação dos atores e das filmagens.
- Durante o mês de exibição da minissérie, uma exposição montada no Centro Cultural da Ação da Cidadania, no bairro da Saúde, no Rio de Janeiro, mostrou ao público parte da cenografia, dos figurinos e dos objetos de arte criados para o programa.
- O Quadrante foi o primeiro projeto de teledramaturgia da TV Globo trabalhado em multiplataforma, com conteúdos complementares exibidos em diferentes mídias. O canal GNT realizou um documentário sobre a vida e a obra de Ariano Suassuna. O Multishow exibiu uma edição especial do Revista Bastidor, mostrando o processo de criação, entrevistas e o dia-a-dia das filmagens. E o Sistema Globo de Rádio transmitiu entrevistas com os atores da minissérie e artistas ligados ao Movimento Armorial.
- No último dia de filmagem da minissérie, em 22 de dezembro de 2006, a TV Globo, a Fundação Roberto Marinho, o governo do estado da Paraíba e a prefeitura de Taperoá assinaram na cidade paraibana os termos de cooperação técnica para os projetos “Casa de Cultura Ariano Suassuna” e “Tecendo o Saber”, sistema de educação do ensino fundamental. A Casa de Cultura Ariano Suassuna, que entraria em funcionamento na estréia da minissérie, foi concebida para ser um centro de referência da cultura local. O imóvel escolhido para sediar o projeto, construído por João Dantas Suassuna, pai de Ariano, e onde o escritor passou a adolescência, abrigou os ateliês de direção de arte e cenografia. Além de uma sala de visitação com exposição permanente da obra do escritor e de criações feitas para a minissérie, abrigaria uma oficina e uma loja de artesanato para atender aos artistas da região e aos que integraram as equipes de figurino e arte, para que eles pudessem dar continuidade às suas produções.
- Exibições especiais da minissérie A pedra do reino foram realizadas em salas de cinema de alta definição, em sete cidades brasileiras - Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Brasília, Fortaleza, João Pessoa e Porto Alegre -, entre os meses de agosto e setembro de 2007. As sessões foram divididas em duas partes: episódios 1, 2 e 3; intervalo; e episódios 4 e 5. O público pôde assistir às duas sessões em seqüência ou em dias diferentes. Foi a primeira vez no país que uma série feita para a televisão ganhou as salas de cinema conservando seu formato original - dividida em cinco partes. As exibições em salas digitais, em um curto intervalo de tempo desde a transmissão na televisão, foram possíveis porque toda a pós-produção da série foi realizada com tecnologia digital de alta definição. Nas salas de cinema digitais, a série foi projetada com qualidade de imagem inédita e mixagem de som em 5.1. Em algumas cidades, foram realizados fóruns com o diretor, o elenco e a equipe de criação da minissérie.
- Em outubro de 2007, a Globo Marcas, em parceria com a Som Livre, lançou o DVD A pedra do reino, contendo dois discos que reúnem os capítulos da minissérie, o documentário “Taperoá” - sobre o processo de criação vivido na cidade e a interação da equipe com os moradores locais - e um ensaio fotográfico em preto e branco batizado de “Nossa carroça”.
- Em 2008, os diretores de fotografia Adrian Teijido e José Tadeu Ribeiro ganharam o prêmio de Melhor Direção de Fotografia oferecido pela Associação Brasileira de Cinematografia (ABC).
Trilha sonora:
- A trilha original de A pedra do reino foi elaborada por Marco Antônio Guimarães, compositor do renomado grupo mineiro Uakti, conhecido por desenvolver seus próprios instrumentos musicais. Ele reeditou com o diretor Luiz Fernando Carvalho a parceria do filme Lavoura arcaica (2001) e criou uma mistura estético-cultural unindo ritmos ibéricos, árabes, indianos, nordestinos, ciganos e indígenas. Entre os instrumentos que usou na minissérie estão o “chori” (feito com uma cabaça grande e duas cordas) e o “iarra”, ambos tocados com arco.
Fonte: Memória Globo
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